terça-feira, 15 de maio de 2012

Ana


A primeira vista é um sequestro. Uma medida de força. Um confrontamento físico. Chama-se imposição, manipulação de outro corpo.  A Ana é os três, os três meninos perdidos em seus desejos. Eles são resultado da incapacidade dela de ser dialogo. É um furo no sistema educacional. É quando a nossa instituição falha. E ela tem falhado com frequência. A Ana é uma peça desse jogo, assim como eles o são.  Ela pulsa a necessidade de construir um novo amanhã, mas esquece de desconstruir hierarquias. Ela não desiste da sala de aula.  Nunca. Que pena. Só quando lhe cortam o ar com um último tiro. 

Eles são meninos perdidos, não ingênuos. São bichos ferozes que precisam responder rapidamente aos impulsos no desespero de cumprir exigências. São primitivos, à primeira vista. Assim como outros tantos alunos, tantos perdidos em suas repetições. Eles necessitam de atenção.

Eu sou esse corpo, que se confronta e se debate sobre outros corpos, os deles, ainda estranhos. Meu corpo exposto, composto de medo, dor e de um prazer continuo de ser provocação. Existe de fato o meu lugar, mulher. Esse corpo com seios e cintura marcada, que tem o cotidiano atravessado pela necessidade de se provar capaz sempre num mundo onde o pênis determina poder.

 A primavera são três homens e uma mulher. Ela queria construir neles a possibilidade de ser diferente. Eles são crianças querendo um conselho, só isso, uma canção de ninar para dormir sem a cobrança de não serem derrota. A primavera sonhada é o desejo de poder deitar-se sobre um peito e se sentir acolhido sem precisar dar respostas constantes.

Primavera leste são esses meninos viscerais que não sabem o que fazer com uma mulher que os desafia. Ela é refém, não vitima. Refém de uma fisicalidade impossível de combater com a força. É o alvo de três setas que não sabem o percurso que fazem, mas agem em desmedida. Ela está amarrada à uma cadeira e eles à ela ( ANA).  Ana é força desmedida das palavras e um medo frio para lidar com o desconhecido. Ela usurpa a si mesma. E reinventa o jogo com cada um. Não há nada de heroico em Ana, nem em Alex. Ana é para Breno um corpo-objeto onde ele deposita seu desejo de ser outro, onde ele finge poder ter poder sobre algo. Breno é para Ana a possibilidade de reverter o jogo usando a palavra e o próprio desejo dele, seu corpo. Italo faz de Ana carne a ser mastigada, e é ela quem o mastiga. Não que ela deseje isso. Ela deseja escapar. Por ela. E por outras. 

Ana torna-se constante movimento. Parada sobre uma cadeira ela move-se entre os três outros corpos. Ela é verbo. É ação movedora do desespero de cada um ali e de si própria. Move em seu silêncio e quando discursa. O silêncio é uma decisão e não uma imposição. Move e desestabiliza por ser mulher. Existe uma força nela, a força de ser mulher, dos 9 meses, do parir. Seu corpo é alvo e arma. E ela quem decide quando será cada coisa. Ela decidiu assim, porque a história   a ensinou a não ser mandada. Não há espaço para vitimização de si mesma. n]ão há choro, nem dor no útero. Tudo deve ser escondido para provar a si a potencia dos seus seios. 

Quando eles acabam, ela vira suspensão constante, incapaz de mover um fio de cabelo. Torna-se refém, finalmente, refém da necessidade de escrever diferente.  Enfim, ela pode chorar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário